Marcela Benvegnu
De Joinville
Dança não é uma questão de gosto. Talvez de técnica, ou mesmo estética. Seu caminho não passa (e não deve passar) pelo “eu gosto”, “eu não gosto”, “eu acho”. Esse não é o papel dos críticos. O papel desses profissionais é o de fazer o próprio sentido da crítica, quebrar a obra em pedaços e apontar novos e claros caminhos. Esse nariz de cera (termo denominado pelos editores para dizer o que não é preciso dizer) se torna necessário aqui. Isso porque depois da apresentação da grande suíte do balé de repertório “Dom Quixote” (1869), de Marius Petipa na Noite de Gala, do 26º Festival de Dança de Joinville muito “se achou” da montagem.
Com remontagem de Valdimir Vasiliev — bailarino do século pela Unesco — a história do balé, um dos mais famosos do mundo, se passa na Espanha, quando Kitri e Basílio enganam o arrogante e rico Gamach, noivo da heroína, com quem Lorenzo, seu pai, a força se casar. Com a ajuda de Dom Quixote, nobre cavalheiro, e Sancho Pança, seu fiel escudeiro, Kitri e Basílio se casam numa grande festa em Barcelona.
Natalia Osipova e Andrey Bolotin, primeiros solistas do Teatro Bolshoi de Moscou foram os protagonistas da noite, interpretando respectivamente, Kitri e Basílio. O entrosamento da dupla nos pas-de-deux (no programa grafado errado como pás-de-deux) era nítido. Ele dono de uma técnica de pés e giros chama atenção ao lado de intérpretes brasileiros que são submetidos ao mesmo programa de ensino: o método Vaganova. Isso porque é russo, tem corpo russo, alimentação e cultura daquele país. Aqui, temos um corpo brasileiro adaptado à técnica russa. Não e nunca seremos iguais.
Natalia é uma excelente intérprete, dona de uma técnica particular para seus poucos 21 anos. Os prêmios e medalhas em festivais internacionais justificam isso. Em cena ela dá show quando é hora de girar. Foram 21 piruetas descendo o palco em diagonal e o mesmo número de fouetés duplos, sendo que cinco foram triplos. Sua pouca idade também é percebida na interpretação. Sua Kitri tem feições de adolescente, mas isso não a faz perder o vigor. Vigor ela tem de sobra. Parece que a música espera seus movimentos serem executados e não ao contrário.
A dupla é um assunto à parte da noite de gala. O espetáculo contou também com a participação de alunos, ex-alunos, professores e da Companhia Jovem da Escola do Teatro Bolshoi no Brasil. Antes de qualquer citação é bem lembrar que eles são uma escola e não podem ser julgados por aquilo que não são. Eles não são profissionais. E assim foi o espetáculo. Uma escola se apresentando na Noite de Gala, que já recebeu em seu palco grandes estrelas. A turma estava bem ensaiada, impecáveis, na verdade. Mas nada que fuja dos padrões. Nada que a platéia já não tenha visto. O colírio fica por conta de Yasmim de Almeida, que interpretou Mercedes, e de Stephanine Ricciardi, que foi a rainha das Dríades. Talentos promissores, de uma escola que tem como missão projetá-los.
O cenário da montagem também chamou atenção. Em tons pastéis e com figuras aquareladas, se destacou em meio aos cenários convencionais de "Dom Quixote" que se está acostumado a ver. Bom gosto.
Os figurinos também poderiam ter dado mais ao balé. Mais brilho poderia enriquecer a peça e valorizar algumas cenas. A parte em que as crianças se apresentam poderia ter sido suprimida ou mesmo diminuída tendo em vista que era uma suíte – uma grande suíte de 1h40 – totalmente remodelada. Afinal Noite de Gala, tem que ser de gala do começo ao fim.
Um comentário:
Parabéns pela matéria.
Sintentizou muito bem a noite de gala do Don Quixote.
Obrigada pelo elogio à minha filha Nine, Stephanine Ricciardi e somente Deus sabe o quanto ela e nós da família fizemos para que estivesse hoje dançando ballet.
A noite foi memorável, aquele dia 20-07-08 será lembrado por muitos jovens bailarinos e profissionais que os prepararam para a noite de gala.
Osipova e Andrey, os convidados da noite foram maravilhosos e também os nossos talentosos jovens brasileiros honraram o que aprendem diariamente no ETBB de Joinville.
Um abraço.
Gostei de seu blog.
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