quinta-feira, 24 de junho de 2010

Tempo

Sabe quando o tempo aperta e você é sufocada por ele?
Quando o tempo provoca uma aceleração cardíaca... ou um aperto no peito?
Ou mesmo quando você, por mais que tente, corre contra ele sem sucesso?
É o tempo sem tempo.
Só me resta sair dele.
Só me resta dançar.
Seja com palavras. Gestos. Olhares.
Aí o tempo corre de mim. Aí eu respiro de novo.
E depois começa tudo outra vez.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Sobre o Festidança

A 21a edição do Festidança aconteceu entre os dias 3 e 13 de junho, em São José dos Campos.
Confira abaixo as críticas da mostra competitiva do evento.

Festidança | Crítica 7 | Pelos Palcos da Vida


Foram oito dias de competição. Dez de apresentações. Muitas coreografias, muitos coreógrafos, muita gente pensando e fazendo dança. De fato a cidade do “avião” tem asas nos pés.

Foi ontem que o palco pegou fogo. A noite começou com o gênero estilo livre conjunto avançado e as meninas do Studio de Dança Gláucia Lacerda, de Santos, mostraram um forró “bomd+”. Além de expressivas o conjunto estava muito bem ensaiado.

O grupo Releve de Caieras, de Caieras, São Paulo fez do palco uma extensão do Pelourinho, quando apresentou “Batuque”, de Gaby Marques. Além de bem estruturada musicalmente, (a coreografia levou instrumentos percussivos para a cena com tambores e latas) o elenco era afinado.

Na dança contemporânea conjunto avançado o Grupo Viva Arte, de Valinhos, São Paulo, mostrou um trabalho totalmente baseado e estruturado em cima dos focos de luz assinado por Ruben Terranova. O primeiro Movimento Lina Penteado, com “Pequenas Percepções”, de Karina Almeida trouxe um pouco de poesia e qualidade de movimento. Os seis intérpretes eram fortes e a simbologia da flor (objeto cênico) trouxe a dramaturgia necessária para a obra.

Quem arrebatou toda a platéia foi novamente Arilton Assunção, com o seu Faces Ocultas Cia de Dança, de Salto, São Paulo. “Proparoxítona” é de uma beleza tão grande, de uma sincronia tão vivaz que fica difícil traduzir. Primeiro lugar em 2009, impossível não reconhecer que o grupo está cada vez melhor. Os 18 intérpretes em cena mostravam a combinação da força com a delicadeza do gesto. É para guardar na retina dos olhos e lembrar quando quisermos ter um bom trabalho em mente.
No jazz conjunto avançado a bateria abriu com “Alma Brasileira”, de Brisa Diamante e Monique Paes, pelo Monique Paes Studio de Dança, de Jacareí. Mostraram que o tempo pára sim. Pára para ver dança de qualidade. O Centro de Arte Lílian Gumiero, de Suzano, São Paulo, apresentou “Hairspray”: trabalho fiel ao original e bem colocado.

O Ballet Ana Araújo, de São José dos Campos, São Paulo, apresentou “Cinética”, de Ana Araújo. Um bom trabalho de conjunto, com uma projeção muito bem feita. E a Companhia Independente de Dança de São Paulo, de São Paulo, apresentou “The New Bossa Nova”, de Edson Santos, com casais bem preparados tecnicamente. Um trabalho limpo e bem pesquisado.

Vale rememorar. Foram-se os dias. A dança aconteceu e reinou na cidade. Ficam na memória trabalhos como o pas de deux de “Paquita”, de Marius Petipa interpretado por Paula Alves e Welber Pacheco (Especial Academia de Ballet | São Paulo),  “Auroras”, sapateado de Bruna Miragaia pelo Monique Paes Studio de Dança (Jacareí), a variação de La Fille Mal Gardée, com Fernanda Soares, do Ballet Elisa (São Bernardo do Campo), “Anton”, de Ricardo Scheir, pelo Pavilhão D; “Hip Hop Our Root”, de Henry Camargo, para a Cia de Dança Kahal, de Jundiaí.

Poderíamos listar aqui tantos outros que passaram pelo palco do 21º Festidança... Que fique a lembrança e a memória de que vale a pena fazer dança independente de colocação, independente da forma como o outro acha que a sua dança poderia ser feita. Que a próxima edição seja tão boa quanto esta. Que quando as cortinas se abrirem hoje, os aplausos sejam para ela: Roseli Rodrigues, que agora faz dança em outro lugar. “Tango Sob Dois Olhares”, merece ser visto e aplaudido de pé. Por ela, para ela.

Festidança | Crítica 6 | Doce Sabor para os Olhos

Marcela Benvegnnu


Finalmente talvez não seja a melhor palavra para começarmos este texto, mas já era hora voltarmos a sentir no Festidança aquela sensação em que o corpo se eleva da cadeira em alguns momentos, tamanha a beleza do conjunto das obras apresentadas. Sim, obras, porque dança é arte.
Quase na reta final do evento, ontem subiram ao palco do Teatro Municipal 25 trabalhos, divididos nas baterias de dança contemporânea (solo masculino e feminino avançado, duo e trio avançado) e jazz conjunto sênior.
No contemporâneo solo masculino avançado foram apresentados bons trabalhos. Intérpretes com qualidade de movimento e, sobretudo, consciência corporal. A dança contemporânea exige treino, técnica, não basta ser um bom bailarino de outro gênero, desconstruir algumas formas e entrar em cena. Pesquisa de corpo, não só de processos e mais processos.
No solo feminino avançado Eugênia Granha Vasconcelos, com a coreografia “Água e Sal”, de Eduardo Menezes, pelo Pavilhão D, de São Paulo, fez a plateia silenciar. A intérprete – que veio do Uai Q Dança, de Uberlândia e no ano passado levou o prêmio de melhor coreografia do Festival de Dança do Triângulo com “O Sabor de Uma Laranja”, de Armando Duarte - mostrou que continua “mais” linda.  A coreografia é extremamente bem construída, o foco central é bem colocado e tem um porque de estar ali. Não é água sal, nem café com leite. É mesmo arte para os olhos.
            Na bateria de dança contemporânea duo avançado o Grupo Corpo Livre, de Valinhos (foto) - crédito Adilson Machado) transformou o tempo em outra coisa, um instante de felicidade. Em cena os intérpretes são um único corpo, a horizontalidade do trabalho chama atenção pela construção inteligente (assinada por Ricardo Scheir), que não precisa ocupar o palco todo para dizer alguma coisa. A coreografia tem um contexto muito bem articulado com a movimentação. Doce sabor para os olhos.
            A Companhia Independente de Dança de São Paulo, que interpretou “Deixa-me Cair”, do talentoso Edson Santos, é tão poética quanto à música interpretada: “Valsa de Eurídice”, de Vinícius de Moraes. E por falar nas trilhas sonoras, ótimas escolhas. Quem nunca ouviu e não se emocionou ao som de “The Sound of Silence”, de Paul Simon?
            Para encerrar a noite quatro trabalhos de jazz dance conjunto sênior. A Escola de Dança Alice Arja, do Rio de Janeiro, com seu Forró Jazz, de Carlos Fontinelli levou ao palco uma típica festa junina do interior. No lugar da quadrilha, o forró. Na seqüência, o Grupo Juvenil Studio A, de Vinhedo, de Zeca Rodrigues, apresentou Barbie´s World (por que dar o nome da música?). O trabalho é visual, colorido. Depois foi a vez da Cia de Dança Kahal, de Jundiaí. “Pulsante”, de Camila Campos é forte. Às vezes até mais forte do que o necessário.
            Fechando a bateria o Ballet Ana Araújo, de São José dos Campos, apresentou “Gente Jovem”, de Ana Araújo. Talvez alguns não tenham entendido a proposta da coreógrafa: o “retrô”. Desde a música, ao figurino, aos pés descalços (com proteção), a dança virou protesto. Aquelas perguntas que fizemos aqui ao longo da semana podem ser respondidas. O nome da música não é o nome da obra. A movimentação é pertinente ao contexto apresentado. E o espaço é usado de forma brilhante: é possível ver as mesmas seqüências feitas para diversos pontos. Em nenhum momento o trabalho cria uma massa que se movimenta junta sem ter o porquê de estar ali. De fato “o novo sempre vem”, mas nem sempre é percebido pelo todo.

MAIS:
- RAÇA CIA DE DANÇA - Quem ainda não garantiu seu ingresso para assistir “Tango Sob Dois Olhares”, de Roseli Rodrigues, amanhã, no encerramento do 21º Festidança, com o Raça Cia. de Dança, o faça. A penúltima montagem de uma das mais importantes figuras do cenário do jazz dance brasileiro, que morreu em março desde ano, deve ser vista e não só gravada na memória. Deve ser gravada na carne de todos aqueles se transformam seus movimentos em dança.

Festidança | Crítica 5 | Dez pequenas reflexões sobre uma noite de dança



Marcela Benvegnu

1 | A quinta noite competitiva do 21º Festidança reuniu somente onze trabalhos. As categorias foram estilo livre conjunto, danças folclóricas e étnicas conjunto avançado e jazz conjunto júnior. Noite pequena. Letra pequena. Texto grande.
2 | No estilo livre quem levantou a platéia (que estava novamente motivada e o artista depende da platéia) foi o Studio D, de Avaré, São Paulo, com a coreografia “Alegria Nordestina”, de Mariana Camargo. O trabalho condiz com a proposta do estilo livre e apresenta uma concepção adequada à idade das intérpretes. O cuidado com o figurino e com as cores das sapatilhas foram evidentes. A narrativa proposta (que dialoga com o release) cumpre seu papel fundamental: ser dança. Ótimo trabalho.

3 | Em danças folclóricas e étnicas a Escola Livre de Dança, - Secult, de Santos, apresentou “Carteado”, de Melissa Ricci. Um bom trabalho de Irish (sapateado irlandês).  Sejam nos digs ou nos clics todas as intérpretes formaram um único corpo em cena. A coreógrafa pensou desde a concepção no uso do espaço e do figurino, pois as cores se misturavam de forma homogênea.


4 | Nas danças folclóricas o trabalho do Grupo de Dança Terracota, de Uberlândia, “De Angola ao Gueto”, assinado por Dickson Du-Arte, mostrou toda a força da ancestralidade africana. Cinco intérpretes usaram o palco de forma inteligente e abordaram os elementos das danças africanas e brasileiras com um toque de contemporaneidade. Um merecido e bom trabalho para trazer à tona a força da cultura negra.

5 | A bateria de jazz conjunto júnior requer aqui uma pausa maior. Antes de qualquer reflexão. O que é jazz dance? Tanto a música quando a dança conhecida com o nome de jazz é resultado de uma fusão de influências e relações que prosperaram nos territórios americanos a partir do século 18. Suas raízes estão diretamente ligadas ao coração da África onde a manifestação não era apenas um espetáculo, mas sim uma forma de diversão.

6 | Considerada uma manifestação unicamente própria de escravos negros das grandes plantações de algodão e tabaco, a cultura do jazz reflete influências de diversas índoles. Por uma parte se apreciam ritmos e bailes africanos que duraram muito na consciência coletiva dos negros, por outro lado estavam às manifestações de origem religiosa onde ritmos e etnias diferentes tinham em comum o mesmo ritual: dançar para a chuva, para pedir fecundidade, para celebrar nascimentos. Suas influências estão obviamente na cultura negra e suas características mais marcantes e visíveis inspiradas nas danças africanas.

7 | Uma outra grande influência nas manifestações de origem negra veio direto da música e da dança branca, mais propriamente da música popular de raiz européia. Assim, pelo que parece claro a influência se deu por via de imitação, as polcas, quadrilhas, marchas, danças irlandesas, bailes ingleses como o clog, começaram a se misturar com danças autônomas para dar lugar ao que conhecemos como jazz. Se bem que foram os negros que entretiam seus amos que elevaram as mudanças da dança africana transformando-a em jazz, mas foram os brancos que começaram a dançá-la primeiro em lugares abertos.

8 | Desde o começo do século 19, quando alguns grupos de bailarinos irlandeses começaram a atuar no país, as danças dos negros eram interpretadas por brancos, que por muitas vezes pintavam suas faces de negro para parodiar, cantar e dançar como tais. Este cenário mudou completamente com a emancipação dos escravos, acordo firmado por Abraham Lincoln no dia primeiro de janeiro de 1863: a dança e o canto dos bailes dos escravos negros agora poderiam sair de lugares restritos e irem para os públicos. Logo, essa dança que começou a tomar conta dos palcos era de negros e brancos e esse momento teve uma influência decisiva na Comédia Musical, que nada mais era do que os primeiros passos do que hoje conhecemos como jazz.

9 |  O  jazz dance é híbrido, nascido de uma multiplicidade de formas de espetáculos anteriores, é caracterizado pelo swing, por movimentos sincopados e pela polirritmia, que é a combinação dos movimentos do corpo em vários ritmos ao mesmo tempo. Existem algumas variações de gênero, como tradicional, lyrical, modern e musical.

10 | Agora sim talvez possamos olhar para a noite de ontem. Eram mesmo trabalhos de jazzdance? Outro detalhe importante: se pegamos a música de um balé de repertório como “Giselle”, colocarmos o nome da coreografia de “Giselle”, o que temos que fazer em cena? “Giselle”! Com o musical é a mesma coisa. Musical também é repertório. Tem que ser fiel. Caso contrário, numa releitura, que pode sim ser feita, não podemos chamar de “Giselle”, porque em cena o repertório se transforma em outra coisa. Dica dada.

MAIS
Sem mais...
 

Festidança | Crítica 4 | Esquentou, mas pode pegar fogo

Marcela Benvegnu


              Vamos refrescar a memória. A noite de domingo, dia 6 de junho, trouxe ao palco do Teatro Municipal de São José dos Campos três diferentes estilos de dança: balé clássico de repertório (variação masculina avançado), dança de salão (duo e conjunto avançado) e dança de rua (conjunto sênior). Hoje, alguns dias depois, quando o 21º Festidança retoma a segunda parte da competição é que temos a chance de parar o corpo e refletir.
A bateria de balé clássico de repertório variação masculina era composta por sete trabalhos. Welton Lucena, que garantiu o primeiro lugar no ano passado, apresentou uma precisa variação de Acteon (do balé Diana e Acteon*), remontada por Adriana Assaf pelo Ballet Adriana Assaf, de São Paulo. Já Edson Artur Machado Júnior, pelo Ballet Elisa, de São Bernardo do Campo, São Paulo, com sua Esmeralda*, mostrou um bom trabalho de pés e baterias.
O nervosismo tomou conta do palco em alguns trabalhos. Uma pena. Todos sabem como é difícil ensaiar horas a fio dentro de uma sala de aula e ter muitas vezes menos de dois minutos para mostrar meses de trabalho. Às vezes vale à pena respirar, pensar que não é uma competição, que os jurados nem estão aí, e dançar. A dança flui melhor, sai do corpo e é absorvido por ele. É preciso entrar em cena acreditando em si. Dançar para si, para preencher os vazios existentes na alma e claro, ter confiança. Talvez seja essa “pitada” que falte em alguns solistas ou mesmo grupos. É preciso acreditar mais. Sempre mais.
Na dança de salão o destaque ficou para o Grupo Viva e Dança, de São José dos Campos, São Paulo, que apresentou “Amor Intenso”, de Marcelo Ribeiro da Silva. As formações são inteligentes e a coreografia é bem articulada. É preciso dar mais valor a dança de salão e essa valorização tem que começar pelos próprios coreógrafos, que tem que tratar a dança, como arte. E trazer ao palco mais do que uma junção dos passos.
É preciso começar a responder questões que são apresentadas na cena faz tempo: Por que o nome da coreografia tem que ser o nome da música? Por que colocar em cena um banco e usá-lo como enfeite no começo e no final da coreografia? Objeto cênico tem que se tornar dança em cena. Qual é a narrativa que eu me proponho a fazer? E os releases? Por que escrever poemas se a coreografia não me fala nada sobre aquilo? Por que escrever “difícil” fazendo com que o assunto mais importante da obra se perca na palavra? Qual é a minha dramaturgia? Como o figurino se relaciona com a coreografia? Que luz eu desenho no espaço? Que formações são mais interessantes para essa dinâmica de movimento que é proposta? São muitas perguntas. Respostas difíceis.
Para encerrar a noite, a dança de rua conjunto sênior mostrou a força e a sincronia do gesto. A Yo! Hip Hop Dance Company, de Sumaré, com o seu “Hip Scratch Box”, de Clécio de Souza, respondeu algumas das perguntas acima. A narrativa era evidente. O nome da coreografia mantinha um diálogo direto com a proposta e o trabalho era muito forte. O Xtyle Project, do Rio de Janeiro, apresentou dinâmicas de movimento muito inteligentes no seu “Desconceito”, de Rodrigo Pires de Souza e Filipi Escudini de Moraes.
A CBS Street Factory apresentou “Elétrons”, de coreografia de Nicolas Karps – primeiro lugar em 2009. O trabalho cuja dramaturgia foca a atração e repulsão dos movimentos também cumpre a proposta que se propõe. Tudo no lugar. Mas indiscutivelmente a noite foi da Cia de Dança Kahal, de Jundiaí. “Êxodo”, de Henry Camargo tem boa música, apresenta uma movimentação que se apropria de elementos da dança contemporânea sem deixar de fazer dança de rua. O figurino é bem pensado e a mudança de música é sutil. Sem contar que quando a música muda, a intenção do corpo dos bailarinos também muda. Esse é um importante olhar para a coreografia.
De fato as noites vieram num crescente, esquentaram. Mas ainda podem pegar fogo... tomara que pegue.
MAIS:
Diana e Acteon – Alguns dizem que este balé, uma lenda grega, foi coreografado por Marius Petipa em 1902, outros que em 1931 Agrippina Vaganova teria recoreografado o pas-de-deux como conhecemos hoje. Fato é que a coreografia se tornou popular e é vista e dançada por diversas companhias no mundo. A versão mais usada é de Petipa, anteriormente coreografado para o balé “Esmeralda”.

Esmeralda – É um balé de três atos e cinco cenas coreografado por Jules Perrot. Estreou em 1844, em Londres e tem música de Cesare Pugni. A variação mais conhecida é a que a personagem, uma cigana, dança com um pandeiro.

Festidança | Crítica 3 | Variações Sobre Um Mesmo Tema

Marcela Benvegnu

Ontem na terceira noite da mostra competitiva do 21º Festidança foi a vez dos trabalhos de balé clássico de criação conjunto (júnior, sênior e avançado) e de dança de rua conjunto sênior subirem ao palco. A noite começa bem com o júnior da Escola de Dança Alice Arja | Rio de Janeiro. “Dreams”, de Daniela Silva é simples e revela meninas bem trabalhadas tecnicamente para a execução dos passos. O que é preciso rever diz respeito ao corte brusco da música (tema recorrente em todas as noites do evento).
Ainda no júnior, o Studio D | Avaré mostrou uma proposta adequada para a idade dos pequenos bailarinos em “Valsa”, de Luciana Grisolia. É interessante notar como ela harmoniza as potencialidades de cada um na cena. Um trabalho que pode crescer ainda mais.
No conjunto sênior “Biocenose I”, de Ricardo Scheir, para o Pavilhão D | São Paulo é instigante. Faz com que o espectador sentado na cadeira sinta a música e seja absorvido por ela. O conjunto é muito bem ensaiado e traz a marca Scheir. É interessante quando um coreógrafo assume seu estilo e deixa isso impresso no corpo dos bailarinos. Uma gramática corporal visível também em “Anton” (foto), do coreógrafo, que competiu na categoria avançada. Sobre a música “Flown”, de Rudy Nundes, o elenco afinado mostrou um trabalho inteligente. A concepção coreográfica articula muito bem os solos, duos e trios, que não deixam em nenhum momento de estar dentro do contexto proposto por Scheir. Um detalhe: o figurino - os rapazes inteiros de preto e as moças com saias de duas cores – exibia uma bela plasticidade.


DANÇA DE RUA – É na dança de rua que parecemos dar voltas, voltas e voltas e cair no mesmo lugar. Primeiro é preciso pensar no nome das coreografias que não dialogam com o que é visto em cena. O nome é a primeira referência que se tem de um trabalho. Depois é preciso pensar na escolha da trilha sonora e se preciso até traduzir algumas músicas. Em muitas coreografias a trilha contradiz a própria concepção apresentada. Também nos com idéias boas que não são desenvolvidas. A história é a mesma dos dias anteriores, porque colocar em cena um objeto cênico se ele não vai ser usado, ou seja, se ele não vai ser transformado em dança?
Também é preciso atentar as formações dos desenhos coreográficos (concepção coreográfica). A obviedade e simetria parecem indicar um padrão de comportamento, mas não é preciso ser óbvio e nem simétrico para fazer dança. Fato é que quando a coreografia começa o olhar treinado já sabe o que vai ver até o final (as poses finais são um capítulo a parte). As coreografias deixam de surpreender.
Ontem quem ousou foi Henry Camargo, com a Cia de Dança Kahal | Jundiaí com “Hip Hop Our Root”. A coreografia tem formações diferentes das convencionais e a movimentação é rica nas construções e desconstruções. O coreógrafo trouxe ao Municipal um trabalho bem ensaiado, que se relaciona com música e título. Também pensou nas cores dos figurinos casuais do conjunto, que quando dividido em duos, trios ou quartetos ficavam interessantes.
Alguns temas: Por que trocar de figurino em um trabalho de cinco minutos e ele não dizer nada? Por que dançar de cabelos soltos sendo que eles atrapalham o desempenho técnico (e plástico) do intérprete? Por que não prender os adereços para que eles não caiam no chão? São tantos por quês.... que ficamos variando mesmo sobre o tema que fazemos e vivemos diariamente: a dança.
Será mesmo preciso?

MAIS:
Início e fim – A coreografia começa na coxia e só termina quando o intérprete sai da cena.. Em alguns trabalhos quando a música termina e os bailarinos agradecem, eles saem do palco como se ali não fosse um lugar de exposição. Por favor, vamos sair do palco de forma organizada. O público agradece, o trabalho fica bem acabado e a dança aplaude.

Festidança | Crítica 2 | Provocações Inteligentes

Marcela Benvegnu


 Sem dúvida foi o sapateado que aqueceu a segunda noite competitiva do 21º Festidança ontem, que contou com trabalhos do gênero em conjunto avançado. A bateria reuniu seis coreografias. Cada uma com suas particularidades, pontos fortes e fracos. Na primeira parte da noite o público, que lotou o Teatro Municipal, também assistiu aos trabalhos de balé clássico de repertório (variação feminina junior, avançado, conjunto sênior e avançado).
            Em cena, os grupos da cidade mostraram sua força e comprovaram a tese de que aqui, na terra da tecnologia, o sapateado é soberano.  O Grupo Corpus (São José dos Campos), de Patrícia Stellet trouxe a cena um “Magnetismo” musical inteligente. Já “Ocre”, da Cia Feeling de Dança (também de SJC), de Charles Renato, mostrou o bom uso do elemento cênico (blocos de madeira), de como ele pode virar dança e ser uma extensão do corpo. E o Ballet Ana Araújo (SJC), com Ritmia, de Ana Paula Veneziani trouxe aos “ouvidos” a sonoridade de pés soltos e de um som limpo.
            Para não ser repetitiva (já sendo), o Monique Paes Studio de Dança (Jacareí) inovou novamente com Bruna Miragaia a frente de “Auroras” (foto). O trabalho provoca e é aí e por isso que se torna tão bom. A música é uma espécie de oração, o figurino mistura o brilho escondido (e revelado) da vida (detalhe para o capuz que não cai da cabeça dos intérpretes) e a coreografia emudece. Emudece no sentido de que é inteligentemente planejada, desde a configuração dos passos para não brigar com a música, mas ser um complemento dela, à disposição dos intérpretes, a simbologia do texto, a plasticidade. A música construída com os pés suspende o corpo do espectador, o espírito. Detalhe importante: Onde estava a coreógrafa durante a apresentação? Em cena. Ela estava no mesmo patamar dos alunos. O grupo era um só. Um único e importante corpo de “anjos de luz”.

BALÉ CLÁSSICO – Clássico de repertório é mesmo um desafio. Um desafio para o intérprete, um desafio para quem está à frente da adaptação. Na noite de ontem tivemos bons trabalhos, como a variação de La Fille Mal Gardée, com Fernanda Soares, do Ballet Elisa (São Bernardo do Campo); O Quebra-Nozes, de Marius Petipa (1818-1910), com Stefanina Petry, para o Ballet Adriana Assaf (São Paulo) e também o conjunto da Escola de Dança Alice Arja, do Rio de Janeiro, com séquito das Fadas da Bela Adormecida, também de Petipa. Trabalhos bem colocados, intérpretes seguras, bem ensaiadas e, sobretudo, com a carga emocional certa para o personagem.
Mas além da preocupação com a veracidade do balé original, com as cores dos figurinos, com o tamanho das coroas (podemos economizar porque a cada espetáculo temos coroas maiores), e claro, com o uso da técnica, um “incomodo” se instaura: (novamente) a qualidade da trilha sonora. Os diretores devem se preocupar com essa limpeza técnica urgentemente. Isso afeta a qualidade da obra, inclusive o modo de se olhar para ela.
Enfim, uma boa noite de sexta-feira. Que venham melhores.



MAIS:

Dia 25 de maio – Dia Internacional do Sapateado. É comemorado por conta do nascimento de Bill “Bojangles” Robinson (1878-1949).

Bojangles - Foi ele o responsável por trazer o sapateado para a meia-ponta. Conquistou Hollywood (em 1932), quando entra para história do cinema americano contracenando com Shirley Temple. Uma de suas mais famosas coreografias é “Backbird”, que dançava em cima de uma escada.

Datas (!!!!-!!!!) – As datas de nascimento e morte são importantes nos textos porque contextualizam um período na história da dança mundial já que não temos nenhum dicionário de dança no país. As publicações internacionais são valiosas, porém, não contemplam personalidades da dança brasileira.


Festidança | Crítica 1 | Nem cá(lá), nem (cá)lá


Marcela Benvegnu

A primeira noite competitiva do 21º Festidança, que reuniu trabalhos de balé clássico de repertório (variação feminina sênior, pas de deux júnior, sênior e avançado) e sapateado conjunto (sênior e junior) trouxe à cena importantes questionamentos, como por exemplo: como andar nas pontas dos pés?
"Paquita", da Especial: qualidadeA pergunta é das mais simples e óbvias, porém, a resposta, não é. Andar nas pontas é um grande desafio para a bailarina. Não é simplesmente caminhar, vai (muito) além disso. E se andar nas pontas requer atenção, escolher a sapatilha certa (para o pé certo) talvez tenha sido o grande desafio desta noite. Duelo difícil entre pés e coreografias.
Histórias de pontas e pés à parte, a bateria de balé de repertório apresentou um tema recorrente quando se trata de remontagens: o quanto de fidelidade com a montagem original tem cada obra apresentada? Existem muitas versões, mas no mínimo elas têm certa conexão e dialogam entre si. Complicado é ver montagens “novas” naquilo que repercute ao longo dos séculos (caso contrário, não se chamaria repertório).  Adaptar não é modificar o trabalho, e sim colocá-lo de forma correta e adequada no corpo dos intérpretes.
Primeiro lugar no ano passado, Fernanda Lopes, do Ballet Jovem de São Vicente | São Vicente, que concorria na categoria sênior com a variação de “Dom Quixote”*, de Marius Petipa* (1818-1910) mostrou evolução técnica e expressão para segurar uma interpretação deste nível. Não basta executar, é preciso dançar.  E quando Paula Alves e Welber Pacheco (Especial Academia de Ballet | São Paulo- foto) entraram em cena para apresentar o pas de deux de “Paquita”*, de Petipa, que a noite fria começou a esquentar. Ele dança para ela. Ela para ele. Um confia no outro. A execução de cada passo tem um porque revelado no corpo, na expressão, no modo de dançar. A qualidade aparece. Os olhos agradecem. O corpo do espectador sente algo diferente. É dança. 
Ainda no clássico é preciso cuidar das gravações das músicas. Algumas coreografias foram comprometidas por chiados e cortes mal feitos. É preciso lembrar que a obra é o todo e não somente uma parte dela.
PLACAS NO PÉ – Sempre esperado no Festidança, o sapateado não empolgou tanto quanto nos outros anos. Tudo esteve mais “morno”, inclusive os desenhos coreográficos. As coreografias apresentavam uma frontalidade excessiva e o “centro”, usado antigamente como o espaço mais importante do palco, volta à contemporaneidade com o mesmo sentido. Por que ter como referência o centro do palco? Sem medo de ousar já é hora de explorar laterais, fundo, frente. É preciso surpreender, fazer com que o corpo da plateia fique suspenso. Claro, isso tudo sem sair da música. Porque sapateado é música.
Apesar de o linóleo abafar a sonoridade das placas de metal, a noite foi de Bruna Miragaia, com seu “Baianá”, pelo Monique Paes Studio de Dança | Jacareí. A música que dá nome à obra (por que a coreografia tem que ter o nome da música?) sai da percussão habitual do grupo e encontra a brasilidade. A luz dialoga com a cena, cria um ambiente para que a dança se revele. A coreografia sai do convencional e usa todo o espaço do palco fazendo com que os interpretes cresçam. A concepção dos movimentos é rica e a sonoridade inteligente. Um excelente trabalho de pesquisa revelado em forma de coreografia.
Que venham os trabalhos avançados e com eles a força de um sapateado que é referência no Brasil. É preciso aquecer o corpo (ainda) frio, bem frio.

MAIS:

Dom Quixote – É um dos mais famosos balés de Marius Petipa, com música de Leon Minkus, que estreou em Moscou em 1869. Conta a história de amor entre Kitri e Basílio. É dividido em três atos e baseado na obra homônima de Miguel de Cervantes. A estreia do trabalho marca a ascensão da Rússia como o centro da dança na Europa.

Paquita – Com música de Edouard Delvedez e coreografia de Mazilier e Petipa, Paquita estreou em Paris em abril de 1846. A montagem dividida em dois atos e três cenas tem como protagonista Paquita, uma cigana que luta para ficar ao lado de seu grande amor, Lucien.

Marius Petipa (1818-1910) –
Nome conhecido no cenário da dança Petipa foi um dos mais influentes coreógrafos de todos os tempos. Entre os seus trabalhos virtuosos ainda destacam-se “A Bela Adormecida”, “Raymonda”, “La Bayadére” e “O Lago dos Cisnes”.

Crítica? – Crítica vem do grego “krinen”, que significa quebrar, partir. Criticar é colocar uma obra em crise, evidenciar e potencializar suas partes. Colocar em crise a ideia que se tem do objeto.  Nada tem a ver com gosto. 

De cara nova

Precisava mudar a cara desse blog.
Acho que porque estou mudando de cara internamente.
São tantos desafios que é preciso respirar fundo e encarar de frente.
Se estou feliz?
Estou.
Mas que todo mundo tem um dia que se sente pano de chão.
Ah tem!

Thank you, Dance!

by Judy Smith "